sexta-feira, outubro 06, 2006

terça-feira, julho 25, 2006

fuga

Passava por entre o som e as pessoas na sala fechada. Os passos seguiam num volume ensurdecedor o ritmo da música - só assim conseguiam espaço por entre as centenas de braços e pernas que se moviam freneticamente. O cheiro úmido do ambiente lotado agora tomava seu ar, enquanto os tapas do som em seu peito o empurravam em direção à saida. Essa maldita luz piscando, e a série de choques de cotovelos e cinturas e corpos e pés o acompanhavam pelo caminho. A porta era longe, como era longe agora o copo que uma mão descontrolada acabara de fazer cair. Mais cotovelos e mais braços, e mais pernas e cinturas e lábios e frações inteiras de qualquer coisa - desses pés todos, quais seriam os seus?! - Um rosto, um rosto!! Não havia ninguém no caminho. Então, enquanto abria os olhos após um leve suspiro, a porta o empurrou para fora.
Era leve a imitação de silêncio do lado de fora. Caminhava através do corredor escuro observando atentamente o teto do único modo que conseguia não observar nada. A máscara parecia apertada. Quente. Sem desviar os olhos para baixo, puxou-a do rosto com algum desprezo e atirou-a para trás. Seguiu assim, com o rosto baixo, o caminho até chegar a um jardim. Andou alguns metros pela escuridão até a base de um arbusto onde, fraco, deitou-se - ou caiu, não sabia bem definir.
'Alô?' Parecia muito longe o som em sua mente. Procurava identificar entre os zunidos todos em sua cabeça o que o chamava. 'Alô!?' De repente, despertou com um susto, abrindo rapidamente os olhos ainda doloridos sem saber bem o porquê.
Por entre as palhas de um coqueiro, Órion o observava curioso. Alerta, correu a vista para o lado encontrando dois olhos muito azuis - esses perigosamente mais próximos que os primeiros - tomados por uma vermelhidão desconcertante. 'Está bem?!' tornaram a falar os olhos, agora mais calmos. Eram olhos estranhos. Explícitos. Violentamente explícitos e inesperadamente doces, apesar da (ou por causa da, é difícil dizer) vermelhidão.
Respondeu ‘oi...’, e a noite foi boa como a muito tempo não era.




[estou voltando... enfim...
e, soh pra constar: odeio não ter tempo.
vou botar um monte de coisa em dia - eu mesmo , principalmente - antes do final da semana :)]

quinta-feira, julho 06, 2006

_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _

quem passar aqui, pelo amor de deus, diga alguma coisa boa.
nao precisa ser nada engraçado nem precisa assinar, não...
basta dizer qualquer coisa boa.

(ou quantas quiser)

segunda-feira, julho 03, 2006

- Dança comigo?
- Essa música não... essa é tão triste...
- De que importa? Não é um baile de máscaras?
- Mas eu vim sem máscara. Essa cara branca e essa lágrima tatuada, eu nasci com elas.
- Então quando parar a música a gente dança.
- E o resto do tempo?
- O que tem o tempo?
- Você não vai t...
- ...
- O que foi? Está rindo de que?
- É que essa mancha no teu rosto sai com o vento. E você nem notou.

domingo, junho 25, 2006

disfarce

:/
não, eu não estou triste.
eu fui suado abrir o congelador
e fiquei com a cara torta.
eu juro.

quinta-feira, junho 15, 2006

leveza

- Eu acho que a tequila tá acabando...
- Espera... Toma outra dose, pega esse violão de volta e pára de olhar o céu!
- Mas eh que... [3 acordes] eh verdade...

[pshiummmm.... pshiummm... pshium...]

Três estrelas cadentes acertaram um castelo de areia e quebraram a vidraça.


- Alguém ouviu alguma coisa?
- Não... (em coro)

Porque é bom não ligar pro céu.

segunda-feira, junho 05, 2006

sábado, junho 03, 2006

anatomia

coisa complicada...
os pulmões ficam no tórax
o coração, no lado esquerdo do peito;
o intestino, no abdómen
Mas, a alma, onde fica?

segunda-feira, maio 29, 2006

avesso

Tudo é meio estranho
mas ninguém percebe.
Todos são meio estranhos.
Essa noite vai chover
mas ninguém armou uma rede na varanda.
Essa noite vai ser mais vazia.
Às vezes um domingo faz falta
mas nunca aos domingos.
E eu, que não entendo essas coisas, eu sou o louco?
E eu, eu que não decidi nada disso, eu sou o avesso?
Não pergunto mais.
Não adianta, não vou entender.
Mas, se não é sobre os porquês,
sobre o que é, então?
Não. Não responda.
Só perguntei de estranho que sou.

quinta-feira, maio 25, 2006

42

É assim: você nasce, toma umas porradas, cresce e morre.
E ainda tem quem ache a vida complicada.
E ainda tem quem se pergunte 'do mistério das coisas'...
Bobagem. Tudo mesmo é só um 'Pá' e 'Pou'.
Um 'Pá' no estomago e um 'Pou' na nuca.

segunda-feira, maio 22, 2006

perfeição

, e você aperta o tubo da pasta de dentes bem no meio
e deixa a toalha jogada pelo chão
e fala querendo ser a senhora da razão. sempre.
e me faz comer sushi sempre que quer comer também
e reclama quando eu faço desenhos de catchup no sanduíche

mas você sorri desse jeito, assim, meio de lado
e eu sei que estou perdido...


[depois de 10 anos sem postar nada...
se eu continuar assim, sem tempo, juro que
pulo da 1a ponte que encontrar. (tomara que
tenha um iate com alguma festa particular
passando embaixo) ]

segunda-feira, maio 08, 2006

sobre estrelas cadentes...

e eu lembro também do escorregador
de onde, quando o céu estava limpo,
se via o céu melhor que de qualquer outro canto.
E quando o céu estava limpo,
logo no começo da noite,
havia um homem deitado no brinquedo
pensando qualquer coisa - ou coisa nenhuma.
Os pés descalços apoiados na grama,
o corpo suspenso como não tivesse peso,
a cabeça leve como não tivesse idéia
e os olhos perdidos como não buscasse nada.

Um pouco mais em cima
um menino deitado cabeça-com-cabeça
- como não tivesse grama ou pé descalço -
e pés pro alto sentindo as estrelas fazendo cócegas
[sim, porque estrelas fazem cócegas
quando os pés ainda são macios
e as costas ainda são leves]

pensando em outras coisa-nenhumas.

-Ali! Viu?
-Onde?
-Bem ali! Acabou de passar! Bem entre as três marias!
-Aquelas três marias, ou outras três marias?

O menino perguntava apontando pra qualquer canto bem longe de Órion,
o pai olhava pra cima
e sorria.

------
[essa semana foi aniversário do homem do escorregador :) ]

domingo, abril 30, 2006

tédio...

Hoje eu não quero fazer nada.
não vou estudar pra prova
acabar nenhum trabalho
modelar o sistema que está atrasado
nem arrumar o guarda-roupas que parece um ropeiro.
Hoje eu não quero fazer nada.
Domingo não passa nada bom na tv.
Eu estou sem saco pra telefone.
Essa chuva toda deixou o meu piano inchado.
Eu acho que enjoei dos meus cds.
Lembrei que ainda estava com os filmes da Mariana
e passei a tarde vendo a Amelie Poulain.
A Mariana, de um jeito ou de outro,
sempre acaba me salvando do tédio.

segunda-feira, abril 17, 2006

Segunda-feira

Hoje o dia amanheceu assim
meio preguiçoso...
Só levantou porque o galo chegou
na porta do quarto dele fazendo barulho.

sexta-feira, abril 14, 2006

sábado, abril 08, 2006

^t^

Não entendo os guarda-chuvas:
Passam o tempo tomando banho de chuva
e mesmo assim parecem sempre tão tristes...

quinta-feira, março 30, 2006

algumas vezes perguntas sao dificeis demais...

daí alguém me perguntou...

- Mas por que você está assim? Medo?

- Claro que não...

Não era medo. Não podia ser medo. Passo horas revirando meus medos e não chego ao motivo.

Eu tenho medo da solidão. Por isso odeio domingos. Por isso não tenho casa e acabo sempre a noite só.Não, não funciona sempre, mas eu finjo que funciona.

Eu tenho medo de crescer, de não poder brincar de quem-tem-a-careta-mais-feia, de ficar velho, fraco, ranzinza, sério, e só chorar quando ninguém estiver olhando.

Eu tenho medo de ser adolescente de vez em quando, sabe... Tenho medo quando minha mão treme, e tenho certeza de que sou a criatura mais ridícula - porque a minha mão treme. E quando a minha mão treme eu tenho medo que a música acabe de repente, na hora que ela disser 'Não!'.

Eu tenho medo de misturar errado as cores em tinta guache e criar uma meleca cinza que não cabe no meu quadro azul. (Eu queria comprar tinta cinza pra separar em todas as cores que eu já perdi!)

Eu tenho medo de um dia ficar careca e usar perucas. Na verdade, penso que as perucas e os CDs de forró deviam ser proibidos! Eu tenho medo de ganhar CDs de forró no natal.

Eu tenho medo de não dormir, de acordar, de não acordar, dos monstros do armário, de ter que arrumar o armário, de perder minhas coisas e de não saber jogar nada fora. . .

Não. Não pode ser medo.

terça-feira, março 21, 2006

6hs

Ouve... já é manhã,
não adianta mais tentar dormir.
Acende os olhos, fecha a luz,
veste qualquer sorriso e sai.
Junta tuas coisas, tranca a porta,
troca essa cara suja e vai.

Tudo bem, nada demais...
Homem não chora,
homem nunca chora.
Vai ver o mar
cata conchas enquanto ainda há sol
constrói castelos de areia
e se esconde em algum calabouço
para sempre: até a próxima onda.

tudo bem, nada demais...
homens sabem surfar
ondas são diversão.
castelos não caem tão fácil.

mas me diz... eu não entendo...
por que essa música não te sai da cabeça?
e por que tuas mãos parecem pequenas demais agora?
e por que teu rosto está molhado?
e por que não chove há dias?

ouve... já é manhã
não adianta mais tentar dormir
a próxima noite vai ser mais fácil
você tem um dia inteiro pra esquecer essa mulher.


[e sabe aquela coisa que você não consegue esquecer?
pois é... esqueça.]

segunda-feira, março 13, 2006

sobre as semanas e sobre os anos...

Hoje é sábado.
Até onde eu posso enxergar
será sempre sábado.
Eu preciso dormir
e eu preciso de um calendário
e eu preciso de meias novas
(hoje vou sair de casa e comprar outro cd).

Essa noite eu vou sair pela noite
e beber três porres seguidos
e dormir bêbado em alguma calçada
e acordar amanha três horas da tarde.
Tudo bem, amanhã não tem missa.
amanhã ainda é sábado.

sexta-feira, março 03, 2006

pelos ecos...

Eu tenho sono, mas não posso dormir
há fantasmas no meu quarto
há monstros embaixo da cama
não, eu não posso dormir.

Vou cobrir meus pés,
ligar a TV, ligar p´ra alguém,
abrir a janela, ver sombras no vento
esperar a noite...
e passar.

Eu tenho medo, mas não posso correr
há fantasmas no passado
há monstros em cima da cama
não, eu não posso correr.

Vou calçar meus pés,
mudar de canal, abraçar alguém
pular a janela, me jogar ao vento
cortar a noite...
e passar.

Eu tenho isso... mas nao posso dizer
há fantasmas nas minhas costas
há montros em meu olhares
não, eu não posso dizer.

Vou esquecer meus pés,
andar pela rua, morrer por alguém,
trancar a janela, passar feito o vento
voltar p´ra noite.
só passar.

[algumas vezes pesadelos são ecos de sonhos antigos ]

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

era uma vez um pintinho que nasceu sem uma perninha...

ele passou o resto da vida ciscando com a muleta.

[nem toda história eh igual...]

quinta-feira, fevereiro 23, 2006

das tendas...


Essa semana eu fui a um circo
e conheci um palhaço de verdade.

Um bêbado de pernas inconstantes
que parece engraçado
porque suas roupas frouxas
permitem que ele seja ridículo
sem ser realmente ridículo;
e que parece leve
porque sua máscara pintada
permite que ele seja feliz
sem ser realmente feliz

Os palhaços devem ser protegidos pelos deuses
muito mais que os malabaristas,
que fingem que voam
muito mais que os mágicos,
que fingem que são deuses
muito mais que as crianças,
que não fingem nada!
palhaços têm isso de não precisar fingir nunca
porque todos acham que é mentira sempre.

Os palhaços devem ser odiados pelos deuses
muito mais que os malabaristas,
que sabem como é voar por instantes
muito mais que os mágicos,
que sabem como é ser deus por instantes
muito mais que as crianças
que não precisam saber nada.
Palhaços vivem a dois passos da verdade
mas têm que fingir, além do rosto, a alma.

[um dia eu queria deixar de fazer graça e ser dono de circo...]

segunda-feira, fevereiro 20, 2006

qualquer coisa sobre chuva, sábado e batata frita.


[explicando por que eu estava há tanto tempo longe disso aqui...
e por que eu estava há tanto tempo longe de mim...]

Eu vi um sorriso cair
e se quebrar no chão.
Não era meu, o sorriso,
mas eu fiquei triste
porque eu queria que fosse.

Eu sei que eu devia estar feliz.
Eu juro que queria estar feliz
Mas as vezes eu acho isso complicado demais.
[é +- isso...]
--------------

Não sei... eu quero, mas não sei por que...
nem sei o que, nem sei como.
eu procuro um nome pra escrever em giz de cera
e quero um rosto com mil caras diferentes
e quero um sorriso por segundo
e quero 5 horas por segundo
[mas quando eu estou só,
não quero hora nenhuma.]
Eu quero uma porção de batatas fritas
e quero poder rir só porque as batatas fritas são batatas fritas.
Eu quero uma chuva fina a noite inteira
e quero sentir um frio imenso nos pés
e ter dúzias de lençóis na minha cama.

Mas, por enquanto, chove forte
e eu ainda estou deitado a grama
procurando num pedaço do céu sem nuvens
um pedaço do chão sem chuva.

sexta-feira, fevereiro 03, 2006

conversa...

' E se . . . se . . .
porque o . . .
Ah, você me entende, né?
Você sempre me entende...'

(as vezes acho que eu sou meio gago de pensamento...)

outra noite...

Estou escrevendo p'ra pensar
porque não consigo fazer qualquer coisa....

É madrugada, agora
e essa maldita torneira não pára de pingar.
[preciso urgentemente de tampões de ouvido
e de um travesseiro novo
e de um inseticida
e de uma janela longe da lua]

E o vizinho faz silêncio demais
[Quem vai me distrair
dessas idéias...
dessas perguntas...
que não param de pingar na minha cabeça]

'Por que... Por que... Por que...'
A água não responde.
As perguntas vêm de parede em parede
de sussurro em sussurro
ser minhas e ecoam só dentro de mim.

Dentro de mim...
Eu... ?
Logo eu, que nunca coube mesmo dentro de mim;
eu, que sigo me equilibrando
em um par de pernas tontas de homem
e um punhado de idéias tortas de menino.

Quem são esses fantasmas no meu quarto?
[Preciso também cobrir meus pés...]

Não, não estou confuso.
Não, não estou com medo.
Não, não sei...

Pensei hoje...
acho que isso de viver não é sobre voar,
é sobre cair na hora certa...

domingo, janeiro 29, 2006

só pra constar...

A noite passada foi boa como a muito tempo não acontecia...

Alguém alguma vez já parou p'ra pensar
que mesmo os cachorros de rua,
desses que ficam nas calçadas das padarias
vendo um frango rodar na máquina de assar frangos,
podem ter noites maravilhosas?

eu nunca tinha percebido...

sexta-feira, janeiro 27, 2006

Necessidades...

Sinto falta das cortinas do meu quarto.

Passei a manhã inteira desenhando
mas isso não me fez menos só.
Acho que não acredito mais em desenhos.
Preciso fechar algumas cortinas.

Eu já não acredito em tanta coisa,
acreditar não é tão simples
e eu não sou mais tão leve.

Preciso parar de ver coisas
de sentir coisas
de quebrar coisas
preciso parar.

Preciso de um sorriso enquanto ainda acredito neles.

quarta-feira, janeiro 18, 2006

sobre as marcas...

Então foi isso. Hoje voltei a ter aulas de FBD. Traduzindo: mais tempo pra escrever na faculdade...

Sabe aquelas horas em que você está realmente concentrado durante a aula? Pois é... Hoje eu estava assim e comecei a olhar p´ro chão.
O chão da sala, que é novo, já está todo marcado. Juro que não entendi. Olhei para cima e não encontrei nenhuma marca no teto. Ora, eu, ao menos, garanto que passo muito mais tempo no teto que no chão, na aula de FBD! (Mas quem vai entender dessas coisas de deixar marcas, né?)
A parede também está marcada. Manchada. Bem atrás do quadro negro. Não vejo, mas sei que ali há marcas. A parede esconde tudo lá porque de manhã, antes das aulas, as meninas desenham coisas boas no quadro e ela gosta de fingir que os desenhos substituem suas cicatrizes.
Hoje eu risquei dois olhos e uma boca no canto da parede. Assim ela vai poder sorrir de vez em quando.

(acho que estou gostando dessa coisa de escrever pra ninguém saber o que eu quero dizer..)

sábado, janeiro 14, 2006

motivo...

'Por que?'

'Porque ela passa assim toda noite
e porque isso de passar é só dela.
E porque a noite, com inveja, não quer mais passar.

Porque ela passa assim
como uma voz que ecoa
um 'espera, fica aqui...' ao pé do ouvido
e diz e sai correndo...

Porque meus olhos roucos
levam noites pensando como dizer
coisas que a façam parar
mas eles não conseguem,
porque olhos falam, não pensam.

Porque o outono era feliz até ela passar
mas hoje, quando ela se vai,
As folhas inocentes se jogam dos galhos
porque em outra vida queriam ser flores.'

[tem coisas que não têm mesmo porquê
mas mesmo assim vem sempre alguem e pergunta...]

quinta-feira, janeiro 12, 2006

agora

Eu queria voltar a escrever coisas pequenas
mas em quantas linhas se resume a tristeza?

Ontem eu fui à praia
e ela não era tão bonita quanto eu lembrava.

quarta-feira, janeiro 11, 2006

imersão...

Uma noite você esbarra em uma porta.
Portas nunca deixam muitas escolhas...
Você entra. É uma sala estranha.
Que cores têm as paredes?
e por que você pisa nas paredes?
os quadros, todos no chão, têm telas rasgadas
e marcas de pés.
Ninguém ali nunca pisou no chão.

Um menino à frente
brinca de imitar tudo o que uma sombra traquina faz
(crianças são assim:
bem mais livres que nós
que temos que decidir tudo pelas sombras)
Mas a sombra não toca as paredes,
Se equilibra entre as palavras do garoto.

Um cheiro doce toma a sala
um cheiro antigo e suave...
Vem de um pôr-do-sol sobre a mesa de canto
porque é outono.

Há um espelho ao lado da porta.
Você corre para o outro lado
e, no outro lado, o avesso de um fantasma
com o seu rosto e nenhuma voz.

Há uma lareira no espelho
mas não há fogo.
Fantasmas são frios.

Uma voz te pergunta
‘O que é isso em teu bolso?’
e você, nu, não responde.
A voz insiste
‘o que é isso em teu bolso?’
mas o que é mesmo isso em teu bolso?

Você tem 7 crimes e 7 motivos.
Você é perdoado 7 vezes do outro lado do espelho
mas é apenas o outro lado do espelho
e um perdão é menor que um motivo.

Que cores têm as paredes?
e porque você pisa nas paredes?

Você tem agora duas escolhas:
Azul ou Macaco.
E nada é tão obvio agora.
E nada é tão obvio agora.

Sua sombra te convida a uma escolha
-cuidado, diz a voz, sombras não enxergam cores!

Mas você sabe que sombras ouvem cores
melhor que você jamais sonhará ouvir.
E as cores todas soam mais tristes que qualquer blues.
Você se junta àquela criança.

Há palavras soltas na sua mão
Quem escreveu na sua mão?
E por que as folhas todas estão em branco?
Que segredos elas guardam?
(o que restou do outono?)

Você ainda não tem nenhuma pergunta
E há respostas abrindo as janelas
mas você simplesmente não as entende
nada é tão obvio agora.
e nada é tão obvio agora
que a sala entrou em você.

[não sei com você, mas comigo acontece sempre...]

terça-feira, janeiro 03, 2006

Sobre os sonhos e sobre acordar...

Sobre um homem que um dia dormiu
e sonhou por uns quatro anos
até que um dia alguém deixou cair
qualquer coisa boa ao lado da sua cama

e me parece que coisas boas quebram facilmente.
ele acordou com um susto.
(como se fosse, ao invés de acordar,
sonhar dentro do sonho.)


P´ra onde ele olha?
Aquela esquina de sempre,
que esquina é aquela?
e os carros e as casas
e os rostos em preto e branco
que gente é aquela?
ele não sabe...

e se a esquina adiante
não lhe parecesse tão distante agora
talvez fosse até lá tomar dois litros de ovomaltine
e cair bêbado em qualquer outra esquina em preto e branco
(que cores o condenariam agora?
a que dores o condenariam agora?)

Por um momento ele queria ser feito
daquilo que são feitos os sonhos
e por um momento ele queria
não ser feito de nada.

Até os sonhos terminam alguma hora.
e o que vem depois dos sonhos?
Fica a gente, ficam os travesseiros,
fica o tempo e fica o vazio a preencher o tempo.
Depois, passa também o tempo
e, com sorte, passa também o vazio.

ele senta-se a uma mesa e espera.
e sentará ali por dias intermináveis
até que venham o cansaço e o sono
a convidar o travesseiro.
Sim, ele sonhará novamente
e não importa o que aconteça
vai aprender a sorrir outra vez..

por algum motivo,
qualquer coisa entre Morfeu, Eros e Tanato
não nos deixa em paz...